quarta-feira, 2 de junho de 2010

Sem mapa

O som que o fogo que sai do isqueiro faz quando encosta no cigarro e o acende, causa uma espécie de entusiasmo que corre por todo o corpo e traz um tom adocicado na noite. Transporta junto à solidão, o gosto de manga rosa fresca das tardes de verão.
Como pode ficar presa no teu quarto a relutar?
Onde estão as balas que ficavam ao lado do abajur que desenhastes na mesa de jantar, para iluminar os rabiscos no papel? Agora fazem parte de ti, assim como a fumaça que entra pela tua boca, que se aloja nos teus pulmões e que, possivelmente te leve a morte. Esta, talvez precoce, com um tiro no peito no meio da noite, sem saber de onde ele veio; quem sabe enquanto atravessas a rua, na espera de um ônibus que te levará em um lugar qualquer, na incansável busca por mais café, uísque, sorrisos, água que se pode tingir.
As balas se foram junto com o ônibus e a parede mostra frases que escrevestes, ontem, anteontem, naquele sábado ou feriado de 99, ou que ainda não saíram da tua cabeça. Figuras na parede. O coração mal desenhado, desapontado com flores ao lado, espinhos. A compreensão refletida na parede, que um dia levaram a culpa, junto com a discussão na janela do segundo andar, no tremer das mãos pelo medo do escuro. Paredes com desculpas. Desculpas construídas para justificar as tão inúteis perdas. Embora tenham tido significado em determinado momento. Que se foi.
Desculpas cheias como o cinzeiro que pede para ser esvaziado. Cinzas discutindo por espaço. Cinzas que mostram quanto tempo falta para o sol nascer, e que até lá, ficarás de olhos arregalados, observando... Sugando a falta de som que se produz. Silêncio.
A boca encosta suavemente na xícara vermelha, que não é de porcelana, mas queima os dedos quando o café está bem quente, assim como as palavras mal ditas queimam a língua e o espaço. As pequeninas flores desenhadas na colher que imita uma prata barata, mistura o café morno que grita para ser jogado fora, também grita a vontade de um café mais quente. Um novo café velho.
Entre a vontade de um outro café e o cigarro na mão, a faísca de fogo que mantém o cigarro aceso, pisca. Sorri e joga um certo charme sobre o quarto. Te seduz com um brilho imensurável, pedindo para não acabar. Querendo mais. Como se não estivesse contente em somente ser transformado em cinza. Despejando lágrimas com a fumaça, aclamando para que o seu brilho fugaz fosse além do que uma simples cinza num cinzeiro cheio. Então, faz-se a vontade do fogo. Outro cigarro é aceso com aquele fogo. Fogo iniciando fogo...
Tossir? Pura satisfação! Estar no equilíbrio da gravidade, contudo às vezes, cair no chão...

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