segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Calo-me



Calço os sapatos apertados e ouço os meus próprios passos. Ando. Andei.
Olho minhas mãos que tremem enquanto desenrolo o compasso dos passos que insistem em ficar, sem nada dizer.
Então digo.
Digo cantando em versos, a prosa daquele teu movimento simples, forte que mantinha em pé. Conduzia os passos que agora acabam.
Olho as mãos salgadas, das lágrimas jorradas feito fonte velha que seca- o mar na face escorre feito onda, transbordando em lágrimas do dizer- calado.
Calo-me feito pedra. Paro. Parei.
Os joelhos se dobram com o gosto do chão que enxuga a face. As mãos cortam-me a carne. E aquele teu gosto lúcido me mostra e pede: ‘vá além’
Vou.
Entre  distância e som, o calado silêncio toma-me. Cala-me.
Tortura a boca que nada mais diz. E os dentes cortam-te.
Um toque e levanto.
Sinto um sussurro longe, invisível aos olhos mastiga os ouvidos.
Em pé. Olho-te nua. A carne crua faz-me te ver,  feito leão.
Espero, calada.
Teus olhos postos ao chão ainda me dizem, feito eu.
Donzela acariciando a fome. Essa angústia do teu sangue-meu em minhas mãos.
Calo-me. Deixo o sal tocar-lhe a pele, transportando esse meu viver, no teu.
Respiro tua boca, já calada.
Calo ainda mais o teu silêncio- meu.
Olho-me em ti, sou eu.
Os olhos adormecidos no calor das pálpebras apagam a luz.
Calo-me-te no escuro – abismo.
Tua pele pura toca o gosto e o desejo.
Corro e tremo.
Olho tuas delicadas unhas e permaneço no profundo silêncio – meu.
Calo-te-me, que sou eu, em você.
O mesmo gosto do pecado puro, afoga o nosso dizer que é silêncio.
Afoga-te-me. Engulo a tua vontade inexistente e minha garganta faz-te vinho n’água.
Calo-me em ti, que sou eu.
Arranco-te minhas vontades e debruço-me no silêncio.
[...]
Calo-me e te olho, pois tu calada também me vês.  


terça-feira, 19 de julho de 2011

Pulsa o querer


É no silencio da noite que me provocas, que com doce olhar me seduz enquanto canta em meus ouvidos as notas em lá menor.
Compõe canções dos meus sonhos, de te tocar, de longe.
Como mariposa desejando o calor da lâmpada minha pele te aclama... Pede que atravesses esse elo distante que nos separa, que te cerca e aprisiona... Esses olhos negros-claros que sorriem ao meu lado, mas não permitem te tocar... Pois tua boca boceja o gosto meu, que daqui salivo, olhando-te de perto-longe. Esses teus passos que me torturam, toda vez que longe vai, mais perto fica. E, não há nada tão bonito quanto o som daquele teu velho olhar, na sombra escura, que provoca o teu próprio riso, ao me ver – crua. Feita em pedaços de tortura com teus risos, que me sustentam. E num passe, distorce... Aprisiona ainda mais teus pensamentos. Esconde. Corre... E, quanto mais longe vai, mais perto fica. Permanece. No gosto do riso das canções que te refletem, ao passo que minha pele crua, ainda espera a hora, do toque. Teu. Meu.  

Saliva e som


Me contenta esse teu riso não dado,
e tua boca que dizia – no silêncio.
Faz-te santo nos meus olhos,
cativando a alegria.
Corre solto pela noite,
abraça, aquece a ventania.
Arrasta a face à alegria,
de viver sem clarear o dia.
Traz da noite o teu silêncio,
afoga a minha fantasia.
Pinta os olhos em minhas lágrimas doces,
amargo o riso não contagia.
Que não só de encantos faz-se o dia,
nem de vertigens se enche a agonia.
O silêncio grita nos olhos em choro,
querendo o riso ao raiar do dia.
Fecha os olhos contemplando a noite,
na presença sentida de longe.
Perto o riso – silêncio dito,
quer-te os olhos e depois os ouvidos.

Diz-te
Aqui, entre o chão de pedra do caminho que te levas e te machucas os pés, encara a dor.
Chora as feridas entre os dedos, e deixa pra trás as unhas que te impedem de seguir.
Segue com o teu riso, mesmo na presença da dor.
Transforma o sal que te corta a face, em mais uma canção de amor.
Acredita no teu riso.
Faz da tua dança o sublime olhar em teu interior.
Reflete o que tu sentes, esquece essa dor.
Leva a alegria e o riso, o encanto e o esplendor.

Corre!


Vem correndo nessa noite
Noite pressa vem trazer
Que as estrelas longe brilham
A vontade do correr
Correr pra longe o passo
Acelerar o coração
Palpitando a pele nua
Condensando a solidão
Dedos soltos em ti cantam
O som dos poros, pés e mãos
Teu movimento e riso solto
Libertam a escuridão
Faz do brilho das estrelas
O olhar da compaixão
Que a lua em ti reflete
Desejo, sangue, respiração.

Manhã


O canto verde acelera. Traz as folhas perto de ti.
Teu corpo leve entre o gramado, aquele sorriso do feriado – cinza trancado.
Prédios que condenam os passos, e ainda assim te calas.
Aclama a liberdade que te cerca, e que tu não vês.
Dança com o amor que te sorri, ao lado esquerdo.
Escolhe a dança, da alma.
Perdoa os passos dados sem saber.
Liberta esse querer que te engasga.
Traz na tua voz o som do azul
Que tua pele rabisca então reluz, o brilho da manhã que ainda não vi.

Demora- espera


Então vá.
Não demores, fujas do meu olhar
Que te dilacera.
Te afasta. Em choro.
Lágrimas de angústia do querer.
Respira.
Encontra os passos e limpa o teu armário.
Corre da chuva que te lava.
Deixa a lama nos sapatos, e se afasta de mim.
Chore o meu choro, transformado em riso.
Esquece a cor daquele batom, que rabiscou o vidro.
Fecha a porta e se vá.
Encontra os passos, esquece a mala...
Desprenda-se
Escolhe o olhar
Engole o choro
Fujas do meu olhar, que te aprisiona
Corre
Leva o começo, deixa aqui o fim
Engole
Relata os passos, te libertas, de mim
Cuida os olhos, escolhe bem as lágrimas
Que o riso, sozinho sorri
Encontra o caminho
Saia daqui!

Sal, pele


E me inspira toda vez que te retorce e te aclama. A pela escassa, da luxúria que te cerca os passos. Dos teus sorrisos, beijos marcados no porta retrato, que escondes entre a gaveta e teus escritos. Os rabiscos da leveza da caneta que com raiva quebrastes, depois de prender os fios leves do teu cabelo, que naquela manhã, enquanto o sol trazia risos, tu choravas escondido em ti mesmo. Disfarçando nas lentes a angústia do saber. Aquele saber de longe, mas sentido perto. Na pele. Tua.

Move lábios, mãos a dança


Tão doce vinha o vento. Trazendo amor e esquecendo-se dos lamentos.
Poderia então dançar?
O sorriso bailava no ar, cabelos deliciavam-se com os movimentos.
Os olhos, perdiam-se no horizonte e fechavam-se.
Não via a boca se quer um minuto sem sorrir! E como sorria! E como me encantava!
Ah, ela contagiava!
Aquele vermelho doce, me fitava, me convidava a dar-te outros mais risos como se estabelecesse uma conexão.
Estendia-me a mão que suave me tocava, então, eu dançava.
Tão doce se sustentava, permanecia, queria. Ficava. O tempo então parava.
Uma felicidade! Que se refletia em cada passo, ato, compasso daquela dança... Do viver dançando e aproveitando a felicidade de ser... Realmente o que se é! Transparecendo nos pés: a dança tocando alma e coração.
Ela tocava-me com os olhos, fazia-me sorrir com tuas mãos.
Sorrisos, dança, o vento vermelho contornando o chão.

domingo, 10 de abril de 2011

Do vermelho escorre fogo. Água, sangue: solidão?


Fez-se os olhos do próprio coração, para que palpitasse também as lágrimas de solidão.
Ali estava, sem cigarro na mão, vendo a fumaça que saia do chão. Cinza jorrando pelo ar, e desenhos a flutuar por toda parte, até a imensidão. Poderia dar-te a mão? Não.
 Os pés corriam passos para longe do toque, e, mesmo que os dedos quisessem ou pudessem alcançar, os ombros permaneciam, abaixo da cabeça, acima do coração. O lamento entrou em combustão, e os pés deliravam no chão. Assim ia, assim fazia. Delírios que corroíam o colchão, permaneciam entre as pernas e mãos, que suavemente tocavam a si mesmo. Os olhos de coração, despejavam lágrimas corridas de sangue, que jorrava como água com o sal feito pedra, sangue pesado, ardido, escorrendo na contra mão da face. E desejou ter dito mais uma vez não.
 Assim, as lágrimas de solidão, trouxeram a raiva que dilacerava o coração. Poderia ir à luta, dar uma chance a própria razão? Alcançaria os sonhos de dormir sem temer o coração? Que tudo sentia e pouco fazia, fazendo- o derrubar, prato e panela, antes que chegassem as mãos? Sem feijão no fogo, sem alimento de antemão, assim alimentava os sentimentos: com fome, angústia, insatisfação: de não querer nada! Geladeira, banheiro ou mansão. Almejando somente o vento, para levá-lo dali- pra bem mais perto da solidão. Solidão que sentia, mesmo entremeio um milhão. Solidão que queria, mais do que qualquer pão. Solidão que despia, a roupa da noite na nudez do dia, que sorrindo se ia, cada vez mais perto: no chão. E no alto, permanecia, o movimento dos dias, com lágrimas misturando sangue e solidão: palpitava rápido o coração, dilatando os olhos, perturbando a cabeça, pés e mãos.
Um litro de água, pra observar a evaporação.
Fósforo: atear fogo no colchão, deixar livre o coração... Que nos olhos, despeja amor, escorrendo em sangue e solidão...

quarta-feira, 16 de março de 2011

Nos olhos, explosão!

Começava com a chuva no sonho, quando ainda estava de olhos fechados enrolado no cobertor. Aos poucos, a cabeça começava a ter uma dor terrivelmente insuportável, e, como um strike no boliche os olhos se abriam, arregalados com o impacto.
Então sabia.
A vontade de não levantar, entusiasmada pelo medo, fazia-se presente. Mas os pés sabiam onde deveriam tocar o solo durante o dia.
Um pingo de coragem aparece entre a janela e, antes que se perca, já está de pé. Diz a si mesmo que o dia será maravilhoso, que se esforçará para que seja o melhor dia de sua vida, mas no fundo, sabe que não vai ser...
“O sinal já foi dado, é melhor ficar em casa querido.” Ela dizia de longe, enquanto ele desviava o olhar, fingindo não vê-la. Mas ela está ali, e só ele sabia.
O relógio bate tão vagarosamente, quanto demora o sinal vermelho, nos dias em que precisamos que estejam todos verdes. Milagrosamente, parece ter debaixo das unhas, toda a magnitude da vida. Sente-a e sorri. Entretanto, não sabe ao certo o que fazer, pois aquela que só ele vê, está ali, em toda a parte, dançando e sorrindo para ele... Seduzindo-o...
Aos poucos a sensação de medo no amanhecer, se vai.
Os pensamentos então, se confundem, mas nada poderia fazer. O sinal já estava dado e ele se propusera a agüentá-lo mais uma vez. Sempre pensa ser a última, mas nunca é... Os pensamentos então tornam-se reais, e o real, fica tão longe que parece fazer parte de outro mundo. E faz.
Inevitavelmente os olhos d’ele se encantam cada vez mais com a efusão que ela transmitia na sua dança. Seu riso era genuíno, uma mistura de imponência e uma luxúria antropófaga que transmitia o desejo sádico no ar.
Os olhos dele começavam a brilhar vendo a sua dança. Estava feito. Não tinha mais volta.
Ele era tomado, então, por tudo que sentia. Veemente era tomado de uma alegria intensa, seguida de uma tristeza de escorrer lágrimas de sangue, que só ele via.
Ela tomara o seu ver. Conduzia a dança como queria. E ele, dançava como ela conduzia. Afinal, estava totalmente fascinado pela sua sagacidade.
Assim, o dia corria em passos vagarosos, com pouca sensatez. Enquanto ele escondia nas unhas toda a perspicácia do viver.
Por isso, roía as unhas. Egoísta, engolia toda a magia metódica do viver. Que de metódica, era só o seu ler. Roía as unhas e a via dançar. Assim seria o seu dia, até o salto mais alto, para o caos profundo...
Seus passos eram de normalidade sem deliberação alguma, erigidos tanto pela luminosidade, capaz de acender uma cidade toda, como de uma obscuridade, capaz de amedrontar até o mais corajoso dos homens... Assim ele andava. Pois, se insistisse em permanecer parado, suas veias explodiriam e seu corpo derreteria na pura vontade do movimento. Portanto, deveria permanecer andando.
Os seus passos, seus risos e suas lágrimas, traziam para perto pessoas. E como ele queria que ao invés de pessoas, viessem pássaros, para que o carregassem céu à fora. Mas não vinham. As pessoas que se aproximavam, não entendiam ao certo o que estava acontecendo com ele, e pouco caso faziam. Ocupavam-se com as ‘grandes’ coisas do dia, como discutir qual será a primeira garrafa a ser aberta ou qual cigarro jogariam pela janela. Todas ocupadas demais, para se quer, perceber as explosões nos olhos dele. Assim, ele se controlava. Mas aos poucos ficava cada vez mais difícil continuar no meio daquelas pessoas. Muitos risos, poucos pensamentos. Quase nenhum entendimento. E ele agüentava.
Derrubava os copos, atenuava a explosão, e ela permanecia diante das suas mãos, que, vez ou outra tentavam, delicadamente, tocá-la. Mas ela fugia, e segundos depois estava a tocá-lo pelas costas, que num arrepio promiscuo tornava-o depauperado. Ele mordia os lábios e precisava correr. Mas não podia. Então permanecia.
Gritava em silêncio para si mesmo, chamando pássaros que devorassem quem estava ao seu redor. Os pássaros porém, não apareciam em momento algum. E quando via algum de longe no céu, devorava-os com os olhos, esperando que nos braços crescessem assas para voar, longe...
Depois do céu, vem o chão.
Ele sentia o peso do chão nos seus pés e corria. Ela flutuava, o provocando. E, enquanto ele chorava, ela sorria. Jamais parava de sorrir, como se o desafiasse a conviver com o seu próprio desejo de sempre sorrir.
Assim o dia seguia. E na noite, o caos fluía.
Ele sono algum sentia, e os pés, mesmo que exaustos não paravam de andar, assim como o sangue não parava de correr cada vez mais rápido, para não se petrificar.
Ele transparecia uma excentricidade nociva. Ela estava cada vez mais perto.
Aos poucos, ela tentava tirar-lhe os olhos, para que pudesse perder-se em si mesmo. Ele relutava, mas o sorriso dela o encantava. Não havia mais nada a ser feito, a não ser, entregar-lhe não só os olhos, mas o corpo inteiro... Entre um passo e outro, perdido no ar, ela dançava fazendo com que ele se rastejasse estando em qualquer lugar. E ele caia. Sorrindo caia. Sorrindo permanecia. Mesmo com lágrimas escorrendo pelas mãos.  
Sorrindo, entregava-lhe os olhos, que simbolizavam o caos. Dali por diante, nada mais seria igual.
Gritos e tropeços chamavam a atenção. Mas as pessoas não sabiam, que os pássaros esperavam escondidos pelo chão... Os olhos alheios tornavam-se presentes, enquanto os olhos d’ele, herméticos dançavam.
Sua voz era de muitos, e também, era como se parecessem nada... Afinal, ouvidos alheios que não vêem olhos, de fato, não conseguem ver nada...
O caos dos olhos levavam os pés na estrada...    

Queres que eu possa?



Poderia ficar horas olhando-te de longe. Como já fizera.
Poderia construir castelos em teu nome, só para fazer-te sorrir.
Poderia te consumir inteiro! Para tê-lo todo em mim...
Poderia lhe pintar o dia, para que me desses teus olhos à noite.
Poderia lhe desenhar a noite, para que pudesse beijar teus olhos no dia.
Poderia arrancar a minha pele, para fazer-te uma perfeita harmonia, em lá maior.
Poderia capturar o brilho das estrelas, para dar-te mais luz, no raiar do dia...
Poderia trazer-te o vento, para que tu esqueças de todos os lamentos, e dance comigo uma sinfonia.
Poderia te dar meu gosto, para que mastigasse sem cuspir em desgosto.
Poderia te dar meu tempo, para que tu vivesse mais, e eu sentisse menos...

segunda-feira, 14 de março de 2011

Naquela Noite.

Diante de todas aquelas palavras o riso se fez presente... refletia o brilho da lua que iluminava o céu e também os olhos. O coração palpitava em harmonia com as estrelas, que dançavam contemplando a noite, que naquela altura, não tinha escuridão alguma. A lua iluminava os sonhos que os olhos acendiam. Fazia com que  os poros lutassem para ter cada vez mais o seu brilho e, num piscar de olhos, as pálpebras trouxeram todo o esplendor da lua, que irradiava encanto...
Então, o encanto tocou a pele e os olhos sorriram tanto quanto a boca. A lua trazia a magia para mais perto da pele, transportava o céu nos olhos, fazia da sua luz, o encanto para o coração...

Depois do 1º Ato - Diálogo.


- Eu me arrependo... Você se arrepende?
- Eu? Hahaha... Eu não me arrependo.
- Quer dizer que se pudesse voltar atrás, o faria novamente?
- Não só o faria novamente se voltasse o tempo, como tenho vontade de fazê-lo novamente a qualquer instante. Faria agora...
- Teria coragem?
- Não percebe que não se trata mais de coragem, mas sim de vontade!
- Como podes ter vontade de fazê-lo mais uma vez? Eu não faria de novo, jamais. Estou com vergonha de mim mesmo por ter feito da primeira vez. Agora sinto medo...
- Eu sabia que tu falarias isso e que se arrependeria. Percebi que você tremia e estava disposto a desistir. Se tivesse que fazer sozinho, não tenho dúvidas que tu deixarias de fazer.
- Como eu poderia não estar com medo? Como eu não poderia pensar em desistir? É claro que pensei em desistir, e me arrependo de não ter desistido... Como eu pude fazer o que fiz?
- Fizemos! E já está feito! Precisávamos fazer.
- Precisávamos fazer? Precisávamos fazer porque nos deixamos convencer de que deveria ser feito.
- ‘Nos deixamos convencer’? Nós acreditamos no que fizemos! Acima de tudo acreditamos.
- Disse bem... Acreditamos! Mas, não tenho mais certeza se continuo acreditando...
- Vais jogar fora toda a nossa dedicação? Sabes bem quantas noites em claro passamos lendo, calculando, sonhando?
- Talvez estejamos errados...
- Errados? ... Me passe o isqueiro. [acende o cigarro] Não esqueça que foi você quem despertou minhas vontades.
- Não esqueço. Mas confesso que com o decorrer de todo o ‘plano’, eu deixe-me influenciar pelas tuas interpretações, e, de fato, tu me interpretastes mal algumas vezes. De modo que mudamos o rumo que eu um dia imaginei.
- Te interpretei mal?
- Sim, e...
- Calma, calma! Preste atenção no que você está dizendo! Não tente agora arranjar uma desculpa prá você se sentir mais aliviado. Fizemos isso juntos! Eu tenho tanta culpa quanto você! E o sentido de tudo que fizemos, resultaria em não sentir culpa alguma. Não percebe que está agindo contrariamente a tudo que seguimos desde a chuva de dezembro?
- Sim, mas... Como eu disse, talvez estejamos errados acerca de tudo que seguimos desde aquele dia. Talvez tenhamos feito algo muito errado, independente do que seguimos ou acreditamos.
- Não use mais o tempo passado! Seguimos e ainda acreditamos
- Eu não sei...
- Até quinze minutos atrás você seguia e acreditava! Não queira negar tudo agora!
- Acho que deixei de acreditar nisso tudo há muito tempo...
- E por que o fez então?
- Medo talvez.
­- Medo?
- Você sabe tanto quanto eu que isso vai muito além de eu e você.
- Sei. E você soube disso antes de mim. Não te esqueça que foi você quem provocou o entusiasmo em mim...
­- Quem está querendo colocar a culpa em alguém agora?
­- Eu não estou colocando a culpa em ninguém! Tu me mostrastes um direção e foi de minha vontade segui-la. E como eu lhe disse NÃO ME ARREPENDO!
­- Esse teu não se arrepender que me causa medo. Desconforto por imaginar os dias que virão... Tu me disseste que tem vontade de fazer mais uma vez...
- Mais uma, ou quantas vezes forem necessárias!
- Acho que não devemos continuar... E se deixamos rastros?
- Não deixamos rastro algum! Sabes bem disso. Trate de te acalmar!
- Como vou me acalmar? Eu vi todos os passos que ela dera... Pode ser que ela não tivesse escolha...
­- Ela tinha outras escolhas! Lembra quando me disse que todos temos escolhas, somos responsáveis pelos nossos caminhos...
- E o que nos dá o direito de interferir nas escolhas alheias, dizer se valem à pena ou não?
- Eu não acredito que estou ouvindo isso de ti! Vai queimar tudo o que lera?
- Não sei, não sei. Eu estou confuso agora, como jamais estivera.
- Isso são lágrimas?
- As mais tristes que um dia de mim saíram... Tu deverias me matar... Tu não, ela deveria!
- Acalma-te! Tenho certeza que se ela pudesse, te mataria. Por isso fizemos o que tinha de ser feito! Fizemos o que tinha de ser feito! Acalma-te companheiro, sabes que ainda temos muito o que fazer...


domingo, 13 de março de 2011

"[...] Ali estava o vento, escorrendo pela parede, derretendo tijolos enquanto as pernas se aqueciam e delirava o coração. O vidro da janela quebrava, mesmo parecendo intacto! Cores com formas de flores misturavam-se com os tijolos derretidos. O casaco com o aconchego do veludo mantinha a parede em pé, firme... Os passos estavam longe, e os pés perto. "

Vê.

Folhas secas contornavam o gramado, transformando-o em um pitoresco tapete. Nos vários tons de azul que coloriam o céu, dedos delicadamente lançavam no vento, o desenho das nuvens. Assim são certas tardes. Tardes em que todo o caos que movimenta os poros humanos vai-se embora; e se fica a sós com o próprio caos, agora calmo.
O corpo então, mistura-se às folhas secas como se fizesse parte delas. E, junto com elas também se seca. Retira o suor do chão, o joga no ar. 
Flutua - o ar.

A-zul.


Cortei os cabelos e o rosto pintei de azul. Para então me disfarçar de abóbora. Mas disseram-me que a abóbora é laranja e não tem cabelo algum. Não entenderam quando eu disse que a abóbora era algo alegórico e volante, que me levava para outro lugar. Assim, procuraram apagar meu azul tentando me transformar em mais um. Mas o meu saldo é negativo e meu bilhete, não tem prêmio algum. O meu azul não sai da pele, ele se estende pelo céu. Meus dedos tem remendos, de descascar a pele... A minha pele com tons azuis. Afinal, o sol queima mesmo na sombra.

sábado, 12 de março de 2011

Leveza do querer.


Desabotoava a camisa arrancando com os dentes os botões, cuspindo-os em qualquer lugar... Pelo chão, rolavam entre tapetes e assoalho, de tal forma, que era difícil de imaginar o quão longa seria a procura para uni-los todos novamente.
Certamente, se misturariam com a sujeira escondida entre os móveis, longe dos olhos.
As mãos tocavam suavemente a pele já fria.
O desejo de arrancar não só a camisa, mas também, pele e ossos fazia-se presente. O pretérito era perfeito e o presente inteiro.
Na boca, aos poucos o gosto forte de canela foi sendo substituído pelo gosto do desejo do intocável... Era como sugar dos próprios dedos o segredo do inferno escondido, e transformá-lo em céu...
Tão céu quanto a cor do seu peito debaixo da camisa, que era feita de tecido pesado, apropriada para esconder as marcas do coração. Entretanto, tecido algum esconde as marcas que os olhos transparecem... E... por três minutos o escondido apareceu. Apareceu em si bemol sustentado pelo medo e descaso. Querendo ser mesmo descaso, mas se perdendo no concreto sem descanso. Firme, fixo, forte. Com dureza e pobreza... Fome de querer sem querer. Mas queria.
Não poderia negar o tecido da camisa rasgada morrendo aos poucos no chão. Perdendo o calor da pele que se roia no meio das unhas... Frias... As marcas eram visíveis. Saiam do coração e percorriam o corpo todo.
Queria. Fazia. Mesmo que fosse com as próprias mãos. Mesmo que precisasse arrancar os próprios dentes. E assim faria na corrida da noite.
Passos parados. Atos fechados. Porta quebrada... Podia-se ver tudo do corredor! Mas isso não importava. Não haveria outro alguém para ver, além das molduras nas paredes. Quietas. Observando cuidadosamente em quase silêncio, cochichando... Pura inveja de estar preso naquele quadrado sustentado pela parede. O que fariam a não ser observar e falar? Poderiam viver? Reviver, diria. Foram congelados no passado, que se fossem aquecidas para o gelo derreter, só lhes restaria lembranças para reviver. Nada saberiam do agora... Por isso não se importava com os cochichos dos quadros. Deixem que falem!
E ouviam gritos.
Até o céu se assustava... Trovões saindo pela janela iluminavam os quartos alheios, encontrando corpos.
Passos parados. Mente compartilhada. Gritos na madrugada. Todas as veias dilaceradas... O sangue inundava o chão indo de encontro aos botões... A camisa foi costurada, a alma lavada – levada... Sustentada.