quarta-feira, 16 de março de 2011

Nos olhos, explosão!

Começava com a chuva no sonho, quando ainda estava de olhos fechados enrolado no cobertor. Aos poucos, a cabeça começava a ter uma dor terrivelmente insuportável, e, como um strike no boliche os olhos se abriam, arregalados com o impacto.
Então sabia.
A vontade de não levantar, entusiasmada pelo medo, fazia-se presente. Mas os pés sabiam onde deveriam tocar o solo durante o dia.
Um pingo de coragem aparece entre a janela e, antes que se perca, já está de pé. Diz a si mesmo que o dia será maravilhoso, que se esforçará para que seja o melhor dia de sua vida, mas no fundo, sabe que não vai ser...
“O sinal já foi dado, é melhor ficar em casa querido.” Ela dizia de longe, enquanto ele desviava o olhar, fingindo não vê-la. Mas ela está ali, e só ele sabia.
O relógio bate tão vagarosamente, quanto demora o sinal vermelho, nos dias em que precisamos que estejam todos verdes. Milagrosamente, parece ter debaixo das unhas, toda a magnitude da vida. Sente-a e sorri. Entretanto, não sabe ao certo o que fazer, pois aquela que só ele vê, está ali, em toda a parte, dançando e sorrindo para ele... Seduzindo-o...
Aos poucos a sensação de medo no amanhecer, se vai.
Os pensamentos então, se confundem, mas nada poderia fazer. O sinal já estava dado e ele se propusera a agüentá-lo mais uma vez. Sempre pensa ser a última, mas nunca é... Os pensamentos então tornam-se reais, e o real, fica tão longe que parece fazer parte de outro mundo. E faz.
Inevitavelmente os olhos d’ele se encantam cada vez mais com a efusão que ela transmitia na sua dança. Seu riso era genuíno, uma mistura de imponência e uma luxúria antropófaga que transmitia o desejo sádico no ar.
Os olhos dele começavam a brilhar vendo a sua dança. Estava feito. Não tinha mais volta.
Ele era tomado, então, por tudo que sentia. Veemente era tomado de uma alegria intensa, seguida de uma tristeza de escorrer lágrimas de sangue, que só ele via.
Ela tomara o seu ver. Conduzia a dança como queria. E ele, dançava como ela conduzia. Afinal, estava totalmente fascinado pela sua sagacidade.
Assim, o dia corria em passos vagarosos, com pouca sensatez. Enquanto ele escondia nas unhas toda a perspicácia do viver.
Por isso, roía as unhas. Egoísta, engolia toda a magia metódica do viver. Que de metódica, era só o seu ler. Roía as unhas e a via dançar. Assim seria o seu dia, até o salto mais alto, para o caos profundo...
Seus passos eram de normalidade sem deliberação alguma, erigidos tanto pela luminosidade, capaz de acender uma cidade toda, como de uma obscuridade, capaz de amedrontar até o mais corajoso dos homens... Assim ele andava. Pois, se insistisse em permanecer parado, suas veias explodiriam e seu corpo derreteria na pura vontade do movimento. Portanto, deveria permanecer andando.
Os seus passos, seus risos e suas lágrimas, traziam para perto pessoas. E como ele queria que ao invés de pessoas, viessem pássaros, para que o carregassem céu à fora. Mas não vinham. As pessoas que se aproximavam, não entendiam ao certo o que estava acontecendo com ele, e pouco caso faziam. Ocupavam-se com as ‘grandes’ coisas do dia, como discutir qual será a primeira garrafa a ser aberta ou qual cigarro jogariam pela janela. Todas ocupadas demais, para se quer, perceber as explosões nos olhos dele. Assim, ele se controlava. Mas aos poucos ficava cada vez mais difícil continuar no meio daquelas pessoas. Muitos risos, poucos pensamentos. Quase nenhum entendimento. E ele agüentava.
Derrubava os copos, atenuava a explosão, e ela permanecia diante das suas mãos, que, vez ou outra tentavam, delicadamente, tocá-la. Mas ela fugia, e segundos depois estava a tocá-lo pelas costas, que num arrepio promiscuo tornava-o depauperado. Ele mordia os lábios e precisava correr. Mas não podia. Então permanecia.
Gritava em silêncio para si mesmo, chamando pássaros que devorassem quem estava ao seu redor. Os pássaros porém, não apareciam em momento algum. E quando via algum de longe no céu, devorava-os com os olhos, esperando que nos braços crescessem assas para voar, longe...
Depois do céu, vem o chão.
Ele sentia o peso do chão nos seus pés e corria. Ela flutuava, o provocando. E, enquanto ele chorava, ela sorria. Jamais parava de sorrir, como se o desafiasse a conviver com o seu próprio desejo de sempre sorrir.
Assim o dia seguia. E na noite, o caos fluía.
Ele sono algum sentia, e os pés, mesmo que exaustos não paravam de andar, assim como o sangue não parava de correr cada vez mais rápido, para não se petrificar.
Ele transparecia uma excentricidade nociva. Ela estava cada vez mais perto.
Aos poucos, ela tentava tirar-lhe os olhos, para que pudesse perder-se em si mesmo. Ele relutava, mas o sorriso dela o encantava. Não havia mais nada a ser feito, a não ser, entregar-lhe não só os olhos, mas o corpo inteiro... Entre um passo e outro, perdido no ar, ela dançava fazendo com que ele se rastejasse estando em qualquer lugar. E ele caia. Sorrindo caia. Sorrindo permanecia. Mesmo com lágrimas escorrendo pelas mãos.  
Sorrindo, entregava-lhe os olhos, que simbolizavam o caos. Dali por diante, nada mais seria igual.
Gritos e tropeços chamavam a atenção. Mas as pessoas não sabiam, que os pássaros esperavam escondidos pelo chão... Os olhos alheios tornavam-se presentes, enquanto os olhos d’ele, herméticos dançavam.
Sua voz era de muitos, e também, era como se parecessem nada... Afinal, ouvidos alheios que não vêem olhos, de fato, não conseguem ver nada...
O caos dos olhos levavam os pés na estrada...    

2 comentários:

  1. cloridrato de benzidamina.

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  2. pô, insPIRADOR! Tu escreve bem guria. E sendo delírio alunógino ou não, "Depois do céu vem o chão" é massa, talvez um pouco de Jung inspirado por Nietzsche; talvez Renato Russo; talvez uma brilhante frase sua; mas o mais provavel é o Quemsabe? E talvez (ainda) voar seja uma queda controlada? Quemsabe?

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Fração de segundos...