Atire em ti mesmo. Provoque a dor e sinta a vida aclamando para ser ouvida. Veja tuas células morrendo e lhes ofereça não só proteína. Injete amor nos teus dias, transponha sal na tua carne. Ofereça teus ossos ao vento e esqueça-te de todos os lamentos. Transpareça o movimento e deixe-se perfurar. Penetre as mãos na areia e delire com o gozo no ar. Permita-se não respirar e continue a sonhar, viver, amar.
Coma teus braços e engasgue-te de ti. Vomite tuas veias e mude o movimento do teu sangue. Retire dos teus rins toda a estagnação. Urine teus templos e construa sem nada esperar. Dos teus pés tire notas, compunha com violinos sons para tua órbita ocular.
Atire em ti mesmo e dê vida ao coração. Mostre ao teu sono o que fazes antes de deitar. Deite-se com teus anjos para que teus demônios possam se perpetuar. Engula tua língua e obrigue teus ouvidos a falar. Mostre tua voz ao vento e não queira nenhum altar. Deixe as paredes do lado de fora e, do universo faça teu lar. Atinja teus sofrimentos e delibere o que há de falar. Escreva nos dentes a retórica de se apaixonar. Do cálcio faça o transpirar, retirar. Mastigue os cercados e as flores, permita-se o transparecer dos amores, e cuspa o que há de voltar. Arranque as próprias feridas, obrigue-as a cicatrizar. Desmembre toda essa casca que envolve o teu trabalhar. Queira uma nova partida, moa tuas unhas e sopre-as no campo do mar. Faça um cigarro do teu DNA, encha teus pulmões com todo o teu pensar. Queime as páginas que te impedem de dançar, pule aquele passo guardado para o casar. Compartilhe com teus ouvidos tudo o que está a faltar no falar. Acrescente uma mescla de seguir no parar. Siga parando para observar.
Destrua a ti mesmo e se reconstrua com um piscar. Quantos anos vai fazer durar? Morra sem pensar em ressuscitar. Ressuscite sem deixar de respirar. Respire sem pensar em parar; pare, sem perceber o respirar. Olhe para ti e deixe-se olhar. Atire em ti sem sangue algum jorrar...