sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

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Busco.
O que busco?
Um bosque, e s c o n d i d o .
Árvores que ascendem e
encontro suas raízes - minhas.

Uma terra para fecundar.

Sinto fome e
moedas não servem
para alimentar.
Sinto fome e
um certo frio.

Assadura
entre as pernas gordas
que passeiam.

Caminho
sentindo o cheiro.
Uivo,
entretanto, primeiro.

Obviamente seriam mais do que cinco segundos em seu coração

Obviamente haveria de querer fumar mais um cigarro sentada a sua frente enquanto conversamos as contradições que nos envolvem. Mas agora deixaria a fumaça muito mais leve e não teria tanta pressa ao acender outro cigarro, ou, em pedir mais uma cerveja. Também eu não teria tanta pressa em devorar os teus olhos, porque já não os esqueço. E igualmente não esqueço de como as ruas, nas noites contigo, jamais eram iguais as que eu encontrava caminhando sozinha durante o dia. O mundo era outro e eu buscava compreender o teu cantar, por isso hoje lembro-me de todas as músicas e de como algumas foram difíceis de encontrar. Queria lhe ouvir outra vez, porque beijaria o teu sorriso ao fim das frases postas sobre a mesa feito cartas, mas tu sabes, eu não sei jogar, entretanto, vivo; porém tu não soubeste compreender que os meus erros de português eram acertos plenos, porque verdadeiros. E eu então tive medo. 

Lhe devorei enquanto te decifrava

Yo te quiero like a beach beijando o mar
em ondas;
y te quiero como um bird
que no encuentra otra forma de amar
a não ser voando (libre).

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

De acordo com meu pai a poesia é ilusão

Meu pai acabara de dizer, nesta terça-feira, dia dezoito, que: "O arco-íris é um prisma. O encontro de duas luzes e a água; a transformação em cinco ou mais cores".
Eu continuo a conversa:  Disseram-me que o céu tem as sete cores, mas por algum motivo que eu já não sei explicar, prevalece o azul.
Ele responde-me: "O céu não tem cor."
Eu pergunto-lhe: Mas e o azul?
Ele então, conclui: "O azul é o Infinito. Por que a Terra é um buraco profundo."

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Tudo escrevo

A mesa sob meus papéis, amassados; organizados em tópicos para melhor compreender. Ainda que não se saiba. E tudo o que sinto repousa em um viés. Palavras repetidas. Iguais. Entrelinhas que se desfazem em um retrós desse tempo. Sublinho o movimento. Mordo os lábios. Choro nessa sexta-feira. Tudo sinto e escrevo. A mesa onde almocei e também jantei. A partilha do alimento e a fome. Sempre há fome. E meu corpo magro chora. Choro. Sempre chorei. Como quando era pequena. Ainda sinto tudo e tudo escrevo. Embora poucas vezes tenha me sentado com a tinta azul entre os dedos, para manchar as folhas brancas de sangue. Meu sangue vermelho intenso, e já não uso mais batom. Mancho os dedos com tinta guache. Não sei pintar. Mas escrevo. Tudo escrevo. A cadeira envernizada que se encosta à mesa onde jantei em um sábado à noite e eu mesma cozinhei. Todos comeram. Muitos pontos. Hoje escrevo com muitos pontos. Por que choro-escrevo com muitos pontos. Tal como a chuva. Como parecesse estar nervosa. E estou [?]. Por que tudo escrevo. Mas nenhuma palavra do que escrevo vale alguma coisa. Essas palavras não trazem comida para a mesa que deixa esse caderno firme para que eu escreva. Por isso não jantei hoje. Também porque apagaram as luzes e fecharam a porta. Foram dormir cedo. Como quase sempre. Eu pouco durmo. Sonho o tempo inteiro. E depois respiro. Suspiro e choro. Também sonho. Como já disse. Agora mesmo estou sonhando. Estou feliz e sorrio. Tenho a pele macia e as unhas feitas. O cabelo penteado. Mulher feita. Como se diz. Caminho levemente decida. Que é prá não cair. Sorrio. Sorrio para mim mesma. Mas por vezes, se me olho no espelho, choro. Choro. Não porque não me reconheço. Pelo contrário.  Por ter consciência desse sentir que não se desfaz. E sou. Tudo escrevo. Mas essas páginas continuam em branco. E então choro. Tudo escrevo. E esse branco que silencia. Tudo escrevo. O voo do pássaro em silêncio enquanto amanhece e eu permaneço. Os sapatos desapertados. Anoiteço. E ainda no escuro, tudo escrevo. 

domingo, 11 de dezembro de 2016

Em presença

Como se não pudesse mais dizer ou querer seguir,
mas vai e diz.
Encontra o silêncio, nada mais.
Como se os olhos mendigassem luz.
Como se somente o vento movesse as folhas.
Tuas mãos intactas repousam.

Vejo teus pés e sorrio.
Teus passos - meus,
não param: me seguem.

Os olhos baixos proclamam luz.
In-dependência da órbita ocular (minha).

Então o frio congela os ossos
e derreto-lhe.
Lenha queimando no fogão.

Tomo-te feito sopa,
só prá sentir o gosto teu - quente - ferve (fervendo).

Espero teu repouso e te mastigo;
corto em pedaços, 
como se retirasse espinhos.

Mãos e pés juntos mostram-lhe o que és.
- gesto e passos - não os deixe parados.

Tuas orelhas ouvem o soar das notas
que os teus olhos diziam
e não vias, ouvias.

E ouço ainda mais forte - 
correndo, pulsando entre meu corpo.
É você,
querendo e dizendo juntar os pedaços.

O vento leva todo o respirar
sem movimentos,
repousa a me olhar.

E se eu quiser correr sem nada te dizer,
vai me devorar quando eu voltar?

Em contradição

Reticências,
retilíneas pupilas
dilatando os sorrisos e as feridas
que
molham o travesseiro,
revirando o colchão.

(em contradição.) 

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Meu coração treme e escurece a minha pele clara.
A minha alma chora,
muito embora o corpo se mantenha forte,
firme,
feito cedro em dia de frio.

Lágrimas deslizam internas e frias
deixando o corpo gélido - quase morto,
palpitando em pedaços que parecem não querer mais se juntar.

Então me despedaço
e
caio mesmo em pé.

Tua vontade e teu dizer me calam.
retém minhas pupilas,
ardem meus olhos
não posso ver;
nem tão pouco me mover.

Houve apenas a estagnação do ser,
em própria,
e,
fecunda,
contemplação.

quando é agora, a pensar nos olhos de Macunaíma

O chá de ontem, que bebo (pois ficou esquecido sobre a mesa e eu insisto), escureceu; gosto forte e frio entre os lábios úmidos de sol. Quem sabe hoje choverá mais uma vez; como na semana passada, ou, como no ano passado, no quase ante-ontem. 
Se hoje não fosse terça-feira;
e a lua cheia, há dois dias (nesse agora - o visível - afinal está sempre cheia:
de olhares). 

terça-feira, 29 de novembro de 2016

Mar é saudade, eu sei

Eu lhe encontro em cada respirar que se perde entre o relógio e a hora marcada.
Lhe vejo em liberdade que sempre sorri
e em seguida acordo. O tempo cá é outro
e as linhas parecem continuar -meia- tortas.
Eu lhe desejo em subtileza inda mais delicada,
em páginas muito bem cuidadas
na maciez desses dedos, pequenos.
Eu lhe desejo presente e concreto, porque quero também tocar,
feito piano,
enquanto sussurro a música da nossa solidão,
onde lhe encontro.

domingo, 27 de novembro de 2016

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Nós sussurramos sorrisos e gritamos a solidão que não se esconde mais,
e as paredes silenciam aos poucos em tinta verde.
É verão e as tempestades sempre se vão
prá depois voltar a esfriar,
não no inverno,
mas no dia seguinte.

As árvores disseram que já basta de papel! Por isso gritamos solidão em silêncio.
Quem sabe se o inverno voltar a ser sereno,
plantaremos palavras que irão livres, sussurrar com vento
nas tempestades de verão que ainda perfumam outra estação.

Não te esquece que é preciso trigo, para se fazer o pão.

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

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Ao olhar para o lado,
verde campo semeado.

Continuo debulhando
sílabas entre os espaços
brancos -

alimentando sons.

E brotando da terra,
plástico.

As mãos entrelaçam

Em seguida caminhávamos ao lado de um rio. Havia certa serenidade em nossos olhares que sorriam, mas sem a completude que se espera da liberdade. Ainda assim, nossos passos eram libres. Livres porque naquele dia não existia relógio em nosso pulso aprisionando o tempo que respira em nosso corpo. Livres porque distantes não apenas do asfalto, mas das roupas do armário, do gás do fogão. Então eu perguntava-me se a liberdade consistia em simplesmente estar longe de tudo que preenche a realidade cotidiana; porque se assim fosse, estaria sentindo-me livre depois de dez dias diante as margens daquele rio? E ao passar daqueles dez dias, teria de seguir a correnteza que des'água onde eu não sei? Por isso apesar de as paredes de cimento estarem tão distantes quanto o sofá à espera que a TV volte a ligar, o estreito corredor que define os passos permanece a apertar o caminhar; e eu insisto. Continuo sorrindo com os olhos já não tão serenos, porém, ao meu lado a pureza de tocar um coração batendo em Vida; um sorriso que amadurece em cada passo e portanto, os olhos voltam a serenar. As mãos entrelaçam. 

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Mas eu só queria comprar um hambúrguer

Permanecemos intactos em vidro. Ilusão que não se desfaz em caco e do corpo acaba restando apenas um fiapo. Nós nos desculpamos pela indecente aparência de estar entre os pés que não se movem e os olhos que tudo veem e querem engolir. Não, não insistimos mas dizemos que sempre queremos sair daqui. E dizemos porque dizer parece fácil. Hoje é fácil dizer. Não há nada atrás do armário querendo levar os nossos sonhos em pesadelo. Hoje se pode dizer filho da puta no meio da rua e as pessoas ainda riem; o taxista que me vê ri e mastiga sem pensar um palito entre os dentes. Em mim vômito e o suor daquele homem escorrendo pela testa reluzente. E mesmo podendo tudo dizer, prevalece um silêncio aturdido entre o caos e meia duzia de passos perdidos que não sentem mais o cortar dos cacos de vidro. Permanecemos estilhaçados e seguimos, como se houvesse sempre mais um espaço vazio para preencher e assim comprar mais um sapato, de salto. Viver é depois porque permanecemos esmagados em ilusão líquida que se faz vidro e não se vê. Ainda bem que podemos falar filho da puta no meio da rua, pena que não reconhecemos mais o vermelho do Velázquez, o amarelo manga, a poesia da Vida no lugar do programa na TV. 

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Ser humano:
telencéfalo altamente desenvolvido e polegar opositor.

E no entanto loucura não é passar três horas diante um ecrã 
movendo o polegar opositor para cima e para baixo. 

Loucura é trabalhar da meia noite às seis carregando galinha
em condições precárias
sem carteira assinada,
para comprar pão, arroz e feijão,
o leite o lápis o tênis (a bola'inda é de meia),
e acreditar que o futuro, será melhor.

Mas aquele outro sujeito me diz que a solução é privatizar a educação!

Ser humano:
telencéfalo altamente desenvolvido, polegar opositor e EGOÍSMO.




quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Enquanto vivo, fragmento



Pediu-me muito gentilmente para que eu não chorasse enquanto deixava a mesa e caminhava sem olhar para trás em direção à porta. Eu, como se conseguisse esquecer dos seus olhos, lábios, palavras sussurrando mentiras, fiz-me mulher de mim mesma e, sem acender um cigarro, acompanhei os seus passos até o outro lado da rua; depois acendi um cigarro e pedi uma cerveja, afinal é primavera e as noites se estendem para além do relógio na parede. Então, com muito cuidado, e, sem prestar muita atenção ao chão que sustentava a mesa, enchi o meu copo de cerveja e deixei que a espuma escorresse entre as minhas pernas e deslizasse em estreito riacho pelo chão. Deixei as pernas molhadas e com a saliva molhei a ponta do lápis que raramente se quebrava, mas que muito rapidamente precisava ser afiado feito faca que retoma a vida e, ainda vendo os seus olhos frente aos meus, escrevi as seguintes palavras: "Vejo o meu amor em sangue púrpura que se esvai do meu corpo tal qual suor encontrando a tua pele. Eu vejo os teus olhos e tu não os vê; acaricio a tua sombra e espero o teu toque em meu pescoço num despertar que jamais se repete. Espero encontrar as mãos colhendo flores e as vejo arranhando a terra como se ferisse o próprio ventre. Olho as minhas mãos sem as tuas e já não sinto tanta vontade de roer as unhas; nem a obrigação de tocar tão perfeitamente aquela partitura que caleja os dedos. Vejo meu amor em sangue simples, vermelho igual à vida que não coagula, mas jorra para fora de si mesma quando o corpo quer aprisionar. Retomo o respirar calmo, provocando o coração que quer cada vez mais uma pulsação, mais rápida e forte e me repito. Me repito em erro derrubando sem querer o copo, quebrando o vidro da janela porque esqueci as chaves pensando em não haver mais portas trancadas. Me repito em r de sorriso forte. Na gargante doendo e cuspindo sangue púrpura, igual ao que vejo, meu amor, preenchendo o meu corpo humano. E assim observo a maciez concreta da carne ao redor dos ossos; as mãos escrevendo e os passos que se redobram, voltando para o mesmo lugar."

quinta-feira, 30 de junho de 2016

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Vamos aos lugares inabitados de nós mesmos, mas não nos perdemos. Continuamos sendo, em presente.

sexta-feira, 22 de abril de 2016

domingo, 7 de fevereiro de 2016

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Tão lúcida,
tão sonolenta quarta-feira de cinzas que se antecipa enquanto seguro a mesma xícara de café quente.
Dedos macios entre a louça branca ardente.
 Tudo queima,
inclusive o corpo.
 Carne profana.

Amanhecer silencioso.


Tão lúcida quarta-feira de cinzas que se antecipa além destas mãos.

E escurece.

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sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

pontu-Ação

O copo estava sobre a mesa ainda úmido. Lábios, vinho e saliva; cuspe na verdade, ao fundo do copo. Escarro sem vertigem. Preguiça. Bitucas de cigarros, sujas. Batom barato escorrendo pela boca em  lágrimas. Tudo igual, e, sempre se repete. Fita cassete soando enrolada no rádio. Som contínuo, extasiante. Preguiça. Pés descalços, amarelos. Unha encravada em esmalte marfim, sujo. Borbulhas. Calcanhares. Caminhos longínquos que perseguem. Pausa. Eternidade e um copo com esse escarro de vida. Grito em silêncios e lágrimas. Contradição eterna que se repete. Fita cassete enrolada, ele enrolado em si mesmo. Perdição. Pausa. Mãos encontram-se em um rosto que se reconhece sem espelho. Ação. Gargalhadas. Dentes linearmente solitários. Ação contínua, táctil. Fita cassete enrolada, som espumando borbulhas entre os dedos. Espelhos. O movimento contí-nú-o. Pausa. Outro copo ainda sujo ao chão. Vinho. Vidro em pedaços. Ação. Pés entrelaçados olham sangrando para o chão. Carne crua, corpo que pulsa. Movimento contínuo. Fita enrolada'inda bate-o coração.

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hoje é dia e sempre perfume

Eu me enlaço nos teus braços e tudo muda.
mudo o mundo mudo.
silencio palavras.
choro e sofro em pausas len-tas.
haverão dias e rosas,

sempre perfume.